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A DIVINA COMÉDIA, de Dante Alighieri

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A Divina Comédia é a obra-prima máxima da Idade Média, precedente da literatura de língua italiana, escrita por Dante Alighieri durante seu exílio de Florença, sua cidade natal, onde encontrava-se com desentendimentos políticos. Dividido em três partes; Inferno, Purgatório e Paraíso, o poema é narrado em primeira pessoa, tendo o próprio Dante como protagonista de toda a história. Guiado pelo poeta Virgílio, escritor da Eneida e que era um modelo de poeta para o autor, ambos descem aos 9 círculos do Inferno, um local de sofrimento e desespero eterno, conhecendo assim os pecadores que lá pagam por seus erros cometidos na Terra. Dante encontrava-se em uma floresta escura sob intensa aflição, quando foi encontrado por Virgílio que lhe disse que uma mulher de nome Beatriz desceu do céu e pediu-lhe que ajudasse o narrador a trilhar pelo inferno, purgatório e por último o paraíso, onde a partir dali ela se tornaria sua guia. Dante se sente encorajado e os dois dão início a esta jornada, aproximando-se da porta do inferno, onde os poetas leem a mensagem de recepção escrita na entrada:
A DIVINA COMEDIA
Deixai toda a esperança voz que entrais.

O portal do inferno fica em Jerusalém, local onde caiu Lúcifer, abrindo assim todos os círculos até o centro da Terra. O próprio Lúcifer pode ser encontrado no nono e último círculo, uma área de frio intenso e escuridão sem fim. Aos que escolheram pecar, é retirada a capacidade de ir aos céus, não havendo a possibilidade de expiar seus pecados de modo algum, apenas aceitarem sofrer por toda a eternidade. Durante todo o trajeto os personagens vão encontrando nos círculos das trevas, várias figuras conhecidas da antiguidade.

O Primeiro Círculo é o Limbo onde ficam os virtuosos pagãos, no Segundo Círculo os luxuriosos, no Terceiro Círculo sofrem os que cometeram o pecado da gula, Quarto Círculo a ganância, Quinto Círculo a ira, Sexto Círculo a heresia, Sétimo círculo ficam os violentos, Oitavo círculo os fraudulentos e por último o Nono Círculo, os traidores.

No primeiro círculo, estão os que viveram antes da chegada de Cristo e os não-batizados, inclusive Virgílio. A única punição deste círculo é viver a eternidade na escuridão sem poder encontrar-se com Deus. Depois da Paixão de Cristo, Jesus foi ao Limbo e retirou dali as almas de Adão, Abel, Noé, Abraão, David, Jacó entre outros.

Os pecadores começam a ser torturados a partir do segundo círculo, depois de serem enviadas aos seus respectivos círculos por Minos, o juiz do inferno, dependendo de seus pecados. Aqui encontram-se também os luxuriosos, que são carregados eternamente por turbilhões de ventos e furacões violentos. Dante conhece o casal Francesca e Paulo, que escolheram cometer o adultério. A mulher é uma das primeiras personagens de todo o poema a confessar ao poeta os seus pecados, chegando a fazer Dante desmaiar de tanta pena e tristeza pela situação dos dois. Francesca não acha justo o que ambos estão passando naquele círculo, e coloca a culpa do que aconteceu em um livro que ela lia e acabou seguindo ao pé da letra o que estava escrito nele. O marido dela, por ciúmes, assassinou os dois.

Quando Dante pergunta o que ambos fizeram para pagar por seus pecados ali, Francesca utiliza uma das frases mais famosas da Divina Comédia:

Nada dói mais do que recordar-se, na miséria, dos tempos felizes;

A DIVINA COMEDIA

Mas engana-se quem acha que o poeta sente compaixão por todos os pecadores durante a caminhada. Dante consegue ser bem duro com quem ele acha que merece o castigo eterno.

— Quem és tu que vens até aqui antes da tua hora?E eu a ele:— Se aqui venho, aqui não fico, mas quem és, que tão feio se fez aqui?Respondeu-me:— Não vês, sou um dos que choram.E eu a ele:— Chorando e sofrendo ficarás aqui, espírito desgraçado, que te reconheço apesar da lama que te cobre.

Ao descer todos os círculos do inferno e dialogar com vários pecadores durante todo o trajeto, Dante e Virgílio chegam ao Purgatório no qual as almas expiam os seus pecados. Mas prefiro polpá-los de possíveis “spoilers” e me limitar ao que ocorre na parte 1 do poema.

Um dos pontos que mais gostei foi da imensa influência que Virgílio tem dentro dos círculos infernais, tomando a frente e “peitando” as criaturas responsáveis pelos martírios sem destemer qualquer um em seu caminho. Quando confrontado por qualquer ser, o poeta conta-lhes que estão trilhando todo o inferno com a autorização divina, e é muito legal ver como essa informação faz com que a passagem seja liberada em questão de segundos.

Virgílio deixa Dante constantemente envergonhado ao dar-lhe sermões quando o poeta florentino perde tempo demais dando conversa para as almas nos círculos. Ele lhe comunica que ambos tem pouco tempo e que Dante deve ser mais breve com os pecadores, que querem a qualquer custo contar suas histórias para que possam ser lembrados quando o poeta retornar à Terra.

Uma barricada não se divide assim quando perde as duelas do meio como vi partido um condenado em dois pedaços do queixo até ali onde se peida. Entre suas pernas balançavam as tripas e estavam à mostra as vísceras e o triste saco que, da comida, faz merda.

A DIVINA COMEDIA

O sofrimento que as almas são submetidas no inferno deixam o leitor compadecido em diversos momentos, pois alguns círculos têm punições completamente brutais, que vão desde centauros atirando flechas nas almas que tentam emergir de um rio de sangue fervendo, até demônios fisgando com tridentes as cabeças daquelas que tentam fugir de sua tortura. Conseguimos sentir a mesma sensação de Dante, caminhando em meio a gritos de dor, cenas de imensa desolação, criaturas mitológicas e demoníacas, sem poder intervir, apenas ouvir suas histórias infelizes e falhas humanas em vida.

Então voltei-me como quem demora para perceber aquilo do que convém fugir e é tomado por repentina covardia, e não por parte mesmo assim, por curiosidade. Foi então que vi atrás de nós um diabo negro, correndo em nossa direção.
Ah, que feições ferozes tinha e como parecia cruel, com as asas abertas e correndo de modo tão ligeiro! Nos seus ombros pontiagudos e imponentes carregava um pecador pelas ancas, agarrando-o pelos pés e tendões.

Dante precisa de Virgílio, pois apesar de poder fazer suas próprias escolhas, se não fosse a ajuda do seu guia, ele não conseguiria superar todos os caminhos e decisões. O mestre o ajuda a encarar seus pecados e julgamentos equivocados, para assim, Dante poder elevar um pensamento correto a respeito das coisas, que apenas o bem compensa e se você se envolver com o mal, terá de responder por isso independente de sua classe social. No inferno são depositados as últimas esperanças de justiça.

Depois que percorreres pelas trevas um bom pedaço, verás que tua imaginação poderá ter se equivocado. Verás bem, se chegares até lá, quanto o sentido nos engana de longe. Por enquanto, para o bem de ti mesmo, aperta o passo. — Depois me pegou carinhosamente pelas mãos e disse: — Antes que avancemos mais adiante e para que não estranhes tanto o que verás logo à frente, saiba que aquilo não são torres, mas gigantes. Eles estão no poço e em volta do penhasco, só do umbigo para cima.

É incrível como um poema escrito a tanto tempo se tornou atemporal, podendo o leitor se  identificar facilmente com várias situações descritas nele, seja através de um pecado semelhante cometido por nós mesmos ou por outros com quem convivemos, até mesmo pelas experiências de vida de cada um dos pecadores encontrados nos círculos. Várias e várias frases maravilhosas repletas de lições de vida e de moral, que podemos usar como experiência para nosso dia a dia até os dias de hoje. Dante Alighieri dá um belo tapa na cara de muita gente, fazendo-nos refletir sobre nossas escolhas erradas, pecados cometidos, nossos impulsos visando apenas o nosso bem próprio, a forma como julgamos a tudo e a todos. A Divina Comédia é uma verdadeira aula de comportamento e princípios morais, e digo mais: se o Inferno de Dante for verdadeiro, acho melhor começarmos a rever muito de nossos conceitos, caso não quisermos sofrer consequências inimagináveis e irreversíveis.


Irmão, o mundo é cego e tu, que vens exatamente dele, sabes bem disso. Vós, os homens, viveis atribuindo ao céu a razão de todas as coisas, dizendo que tudo vem do alto, como se tudo se movesse somente pela necessidade. Se assim fosse, não haveria mais o livre-arbítrio. E se não houvesse a justiça, não haveria felicidade por causa do bem, nem luto por causa do mal. Quem inicia tudo é o céu e o movimento de suas esferas, mas ele deu a luz aos homens para distinguirem o bem do mal e a liberdade de escolher entre os dois. No começo essa luta do livre-arbítrio com o céu é cansativa, mas depois vence a tudo, se de virtudes se alimenta. A liberdade sujeita-se à força maior e a natureza melhor, que criam a razão humana, que, por sua vez, não depende do céu.


Um poema épico, que influenciou milhares na literatura, pintura, escultura, arquitetura, filmes, jogos e músicas. Que é improvável qualquer leitor nunca ter ouvido falar, pois Dante praticamente moldou o inferno como o conhecemos hoje e também registrou vários acontecimentos da idade média que nos possibilita entender toda a cultura e personagens que viveram naquele tempo e em tempos anteriores. Leitura obrigatória.


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