A REDOMA DE VIDRO, de Sylvia Plath
Há anos que ouço falar deste livro, o único romance de Sylvia Plath, e criei uma espécie de mito sobre ele e minha experiência de leitura foi bem diferente do que pensava. Não estou me referindo a um comparativo expectativa x realidade que vemos pela internet, onde esperamos maravilhas e depois vem a enxurrada de decepções, porém comento sobre um sentimento diferente de conexão.
A Redoma de Vidro é uma obra muito conhecida por descrever de forma precisa o processo gradual de depressão que uma jovem, e promissora universitária - que acaba de entrar no estágio de um mês de uma grande revista em NY - passa a viver, quando a doença ainda não possuía métodos de tratamento modernos e menos invasivos como são hoje em dia.
Esther Greenwood é uma jovem muito dividida entre seus sonhos, os pensamentos sobre o mundo versus as convenções sociais e o que se espera de uma jovem aos olhos dos meios sociais. A personagem tem uma acidez peculiar que assustaria até as mais modernas famílias tradicionais da atualidade, como por exemplo, o fato de ter opinião sobre sexo antes do casamento diferente da sociedade, bem como a ideia de maternidade e carreira. Lutas que as mulheres de hoje ainda sofrem represálias por defender, imagina só essas ideias vindas de um livro publicado em 1963! Entre esses pensamentos de vanguarda, anseios e, por que não, algumas futilidades também, de forma tão devagar que mal sentimos, percebemos que a luz da jovialidade foi substituída por uma aura escura e sufocante como se a depressão estivesse vindo conosco. Lento e certeiro, o livro provoca imersão de forma a recomendar que não se leia isso a menos que sua cabeça esteja preparada pra sentir o que Esther sente sem sair tão perdida quanto ela.
"(...) Não teria feito a menor diferença se ela tivesse me dado uma passagem para a Europa ou um cruzeiro ao redor do mundo, porque onde quer que estivesse (...), estaria sempre sob a mesma redoma de vidro, sendo lentamente cozida em meu próprio ar viciado."
Um sentimento paradoxal botou em mim em relação à A Redoma de Vidro. Primeiro porque me identifiquei muito com alguns pensamentos de Esther, principalmente no início. Me senti conectada inclusive com momentos que ela passa quando está na clínica psiquiátrica (deixo um comentário sobre isso no final desse post). Entretanto a sensação de dissociação e apatia me afastaram do livro algumas vezes, fiquei mais de um mês para ler esse livro por olhar e não querer voltar para aquele mundo. Foi como se meu cérebro quisesse dizer que de forma nenhuma eu poderia me identificar com a personagem.
Uma passagem ao qual não vou recordar a página me marcou bastante. Ela menciona que a última vez que se lembra de ter se sentido feliz foi quando tinha ainda nove anos de idade, o que me fez pensar que para nós, que vivemos no automático e que temos potencial de ser diagnosticado futuramente, pode parecer que o problema do tipo surge do nada, mas que os indícios e gatilhos podem existir anos antes de perder o fio da meada. Pessoalmente, sempre que busco algo antigo, lembro que na minha infância eu amava e me identificava com os personagens Leitão e Bisonho do desenho Ursinho Pooh, um hiper ansioso e outro meio melancólico (entenda nesse episódio do Nerdologia). Só damos atenção de verdade quando Esther chega ao ponto de não conseguir fazer as atividades que ela mais fazia corriqueiramente; não há energia vital para dormir, comer e, tudo o que ela mais amava nesse mundo, escrever. Essas atividades são largadas por ela de forma totalmente apática e a faz procurar formas e formas de não existir mais nesse mundo, se é que vocês me entendem.
"Mas eu não tinha certeza. Eu não tinha certeza de nada. Como eu poderia saber se um dia (...) a redoma de vidro não desceria novamente sobre mim, com suas distorções sufocantes?"
A dissociação que tive do livro me influencia no momento em que escrevo esta review. Porque ele não é algo que amei e muito menos que odiei. É um livro necessário com toda certeza, mas não agradável. Não vai me deixar saudades de forma alguma, entretanto tenho certeza que vou pensar nele com mais frequência do que gostaria. E quem sabe, pensando por mais tempo, terei outros aspectos para abordar por aqui?
nota // Um comentário que gostaria de fazer em relação ao tratamento na clínica é que o abominável eletrochoque era comum na época, porém quero ressaltar a diferença entre as abordagens médicas que Esther teve. A primeira foi com dr Gordon, homem, que mal considerou o que ela disse e recomendou o tratamento prometendo melhoras imediatas. Na segunda, mais para frente, Esther se surpreende quando quem a atende não é um, mas uma psiquiatra, a dra. Nolan, por não ser comum uma mulher nessa especialidade da medicina. Aliás, era bem inusitado uma mulher com carreira além de ser esposa e mãe. Se você um dia vier a ler o livro, perceba a diferença que se deu no tratamento dela e compare a abordagem dos dois médicos.


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